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quinta-feira, 9 de setembro de 2010

ISA...LIVRE... DUNCAN

       "Liberdade é pouco. O que eu desejo ainda não tem nome!
                                          (CLARICE LISPECTOR)




A dança é o movimento do universo concentrado no indivíduo». «O corpo do bailarino é apenas a manifestação luminosa da alma». Com conceitos como estes, Isadora Duncan revolucionou a dança do seu tempo, ficando para a história não só como precursora do bailado moderno, mas também como mulher de ideias livres, capaz de desafiar preconceitos e tabus.
Dora Angela Duncan nasceu em São Francisco (EUA), em Maio de 1877, a mais jovem dos quatro filhos de uma família onde a música e a poesia estavam sempre presentes. Após o divórcio dos pais, foi educada pela mãe, pianista e professora de música, que a ensinou a «ouvir a música com a alma» e a amar os grandes compositores, ao mesmo tempo que desenvolveu nela o gosto pela dança, o teatro e a leitura e o desprezo pelos bens materiais. Aos seis anos, já a pequenina Dora dançava a troco de algumas moedas e ensinava outras crianças a dançar.
Desde muito cedo que Isadora – nome que adoptaria quando tinha 16 anos – rejeitou a rigidez do ballet clássico, que considerava «feio e contra-natura», e baseou a sua dança em ritmos e movimentos naturais e espontâneos, muitas vezes até no improviso coreográfico. Dançava ao ar livre ou em palcos onde o cenário era o mais despojado possível: apenas uma cortina escura. Mais tarde, afirmaria: «Descobri a dança. Descobri a arte que estava perdida há dois mil anos».
Porém, numa América conservadora e puritana que tinha dificuldade em entender a sua dança revolucionária, as suas primeiras apresentações em público obtiveram pouco êxito e, aos 21 anos, Isadora partia para Inglaterra. As esculturas da Grécia antiga que conheceu e estudou no Museu Britânico confirmaram o uso dos movimentos que já desenvolvia na sua dança. Também a indumentária que adoptou era de influência grega: uma túnica ligeira e, nos pés, sandálias ou mesmo nada. A paixão pela cultura grega levá-la-ia à Grécia, em conjunto com os três irmãos, por volta de 1903. Vestiam-se como os gregos antigos e deslocavam-se de barco ou em carroça, como na época de Ulisses. Nos arredores de Atenas, compraram um monte, onde iniciaram a construção de um templo em honra de Terpsícore, a musa da dança, mas o projecto teve de ser abandonado por falta de recursos financeiros.
Durante anos, Isadora desenvolveu a sua carreira de bailarina em teatros e salões culturais da Europa. Apresentou-se em Paris, Berlim, Budapeste, Bayreuth e São Petersburgo, onde conheceu Sergei Diaghilev, que a incentivou a criar uma escola de dança. Depois de Moscovo e Kiev, regressou à Alemanha, alugou uma vivenda em Grünewald e aí recebeu 40 crianças oriundas de famílias pobres, às quais oferecia gratuitamente aulas de dança, alojamento e refeições, mas sempre dizendo: «Eu não ensino crianças, dou-lhes alegria».
O sucesso que a acompanhou nos meios intelectuais das principais capitais da Europa não se repetiu no entanto na digressão de seis meses que realizou em 1907 pelos Estados Unidos e Isadora acabou por regressar à Europa. De novo Paris, onde fundou uma segunda escola, mas também a Suíça e a Itália e uma digressão pela América Latina. Em 1919, recebeu um convite para voltar a Moscovo feito pelo Governo soviético, que colocou à sua disposição um palácio para a criação de uma escola.
Isadora conheceu aí o poeta Sergei Yesenin, quase 20 anos mais jovem do que ela, com quem se casaria para lhe dar a possibilidade de deixar a União Soviética. No regresso aos EUA, foram tratados como agentes bolcheviques e sujeitos aos controles de entrada no país de qualquer imigrante. Humilhada e acossada, Isadora acabou a tomar posições favoráveis à União Soviética, atitude tão chocante como as suas túnicas de dança quase transparentes. Também o consumo excessivo do álcool por parte do casal, evidente até nas suas actuações em público, só lhes criou hostilidades num país onde vigorava à época a «lei seca».
Em 1923, o casal deixou os Estados Unidos. «Adeus, América. Não te verei mais», foi a frase proferida por Isadora à partida, promessa que cumpriria efectivamente.
A bailarina passou na Europa os quatro anos seguintes, os últimos da sua vida. Os êxitos entre a classe intelectual não evitavam a constante falta de dinheiro, que a levaria a dançar até nos cafés da Côte d’Azur. Envelhecida e com o rosto inchado pelos efeitos da bebida, Isadora tinha ainda assim a esperança de um recomeço quando a morte a surpreendeu, a 14 de Setembro de 1927, em Nice. Pouco antes, publicava a sua autobiografia, My Life.
A vida pessoal de Isadora Duncan mereceu ao tempo quase tantas manchetes de jornal como a sua arte, graças ao constante desafio das convenções sociais e às trágicas circunstâncias que por vezes a rodearam. «Viver sem limites» era o seu lema e Isadora praticava na vida pessoal a mesma liberdade que exigia para a dança, sucedendo-se os amantes e os excessos.





 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 


"A liberdade é a possibilidade do isolamento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo!" (FERNANDO PESSOA)

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